Escolher o Evangelho é rever a partir dele nossas escolhas
Nestas primeiras semanas no tempo comum, as leituras nos remetem a temática vocacional: o chamado ao seguimento de Jesus e suas primeiras consequências. A liturgia nos favorece a, no início das atividades de 2018, retomar o chamado a ser discípulo de Jesus. No sentido dos projetos em que nos engajamos, nas atividades e compromisso que assumimos e nas escolhas que fazemos, todos esses estão sintonizados com o Jesus sua causa, seu sonho, seu projeto, ou melhor, ainda com o sonho de Deus para cada um de nós? Falando nisso, você já parou alguns momentos deste ano para pensar em sua caminhada? Que passos você dará para aproximar mais suas escolhas do que reconhecer ser sua vocação? As leituras deste domingo são uma ótima ajuda nessa reflexão.
Neste tempo litúrgico vamos ler boa parte dos textos que a comunidade do evangelista Marcos nos legou. Agora estamos no primeiro capítulo. Dentro da experiência de discipulado que faziam, este grupo de cristãos se esforçaram para retomar o que tinham aprendido e experienciado, o que iluminava seus desafios, suas alegria, suas escolhas, os conflitos que tinham pela frente. A este texto ficou conhecido como “Evangelho de Marcos”. A Boa Noticia de Jesus, segundo esta comunidade.
O fragmento lido em nossas comunidades neste fim de semana começa com a prisão de João. Possivelmente, ela foi um marco histórico para Jesus e seus discípulos. É bem provável que Jesus tenha sido influenciado pela proposta de conversão, de vivência radical da Palavra de Deus que João, o Batista, apresentava. O fato de João ter sido preso causa um vácuo, uma lacuna, que diz para Jesus “é agora”. Ele lê em um acontecimento histórico o apelo para “entrar em cena”. E para nós? O que acontece em nossas vidas que mostra a urgência de tornar iniciativas intuições, inquietações, sonhos, projeto?
Olhando as duas pessoas, Jesus e João, como também os dois grupos: os seguidores de Jesus e os seguidores do Batista, vemos continuidade e descontinuidades. Também em nossas trajetórias pessoais temos continuidades e rupturas com propostas e projetos que influenciaram/influenciam nossas escolhas? Que continuidades e rupturas enxergamos?
A comunidade de Marcos dá uma ênfase interessante. A primeira coisa que Jesus faz é Pregar o evangelho de Deus. Merece a nossa atenção essa expressão: pregar o evangelho do Reino de Deus. É nisso que consiste o seguimento de Jesus. Com a vida, e não simplesmente com as palavras; com as atitudes e não simplesmente com as frases de nossas camisas; pregar o Evangelho de Reino de Deus. A Boa Noticia. Deus é amor, ama a todos, nos criou para liberdade e em Jesus nos deu a grande prova do seu amor e nos convidou a, na vida, tecer relações a partir do amor e da fraternidade. Contudo, parece que esta proposta é muito complicada até para aqueles que dizem que querem seguir Jesus, por isso, é preciso se converter: “O tempo se cumpriu / o Reino está perto / arrependam-se e acreditem no Evangelho” (Mc 1, 15). Temos nesses versículos uma linguagem da catequese cristã: evangelho de Deus; converter/ crer/ trazer.
A espera do Reino
Mas é para hoje, não para amanhã. Quais situações de mudança que você anda adiando? O que vai fazer diante dos apelos que o Evangelho te apresenta? A proclamação do Reino, coração da missão de Jesus, coração das nossas escolhas?
A espera do Reino era viva no ambiente em que Jesus nasceu. Eles, assim como nós, sonhavam com um mundo de paz, felicidade, justiça, salvação e sinalizavam o romper do Reino na história. Jesus histórico e a comunidade de Marcos nos chamam a atenção para algo que estava acontecendo naquele tempo.
É só querer mudar que se ‘entra no Reino’ outra dinâmica de vida. O Reino não é só um lugar geográfico, mas é, acima de tudo, aonde Deus reina. E o reinado de Deus se dá onde a vida é defendida, onde se vive com dignidade, onde se compromete com a vida. Romper com tudo que escraviza.
Depois da apresentação do marco histórico (prisão de João) temos nos em Mc 1,14-15 uma rápida síntese da ação de Jesus. O cenário apresentado é o Mar da Galileia. Há uma série de cidades na região importantes na caminhada de Jesus. Estas são lugar de vida e de trabalho, mas também cenários de exploração e de busca por direitos. Aí segue o relato da vocação dos discípulos. Nele, a exemplo de relatos de vocação de profetas, temos os primeiros passos no discipulado de Jesus.
No caminhar de Mestre reconhecemos que Jesus nos alcança onde estamos. Não há outro lugar para ouvir o chamado de Jesus senão na própria vida, nos acontecimentos, no cotidiano. Jesus vê as pessoas. Jesus chama os seus discípulos. Ele é um Rabi (mestre, liderança religiosa da época) um pouco diferente. Não fica esperando que as pessoas venham a ele. A urgência do Reino o põe a caminho.
Jesus chama os seus discípulos a uma vida de continuidades e rupturas com a caminhada anterior. Usa uma linguagem adaptada. Convoca para ser “pescadores de gente”. Como dialogar com as realidades do século XXI? Quais linguagens são necessárias para apresentar aos nossos contemporâneos a Boa Noticia do Reino de Deus? Há poucos dias acontecerá o 14º Intereclesial de CEBs com a temática “CEBS e desafios do mundo urbano”. As leituras de domingo nos ajudam a pensar também nisso.
A cena se desenvolve uma sequência rápida e bem direta, mais importante do que pensar se historicamente foi isso mesmo é reconhecer as experiências e intuições a ser do seguimento de Jesus que a comunidade de Marcos nos deixa entrever neste episódio. Recorda as cenas de chamamento na Bíblia (1Rs 19,19-21). O convite não é simplesmente aderir a uma proposta, ou fazer uma atividade. Seguir Jesus é mais que isso. O convite é a “Ir após ele”. Perfazer seu caminho; Retomar suas escolhas, intuições, sonhos e inquietações. O que isso quer dizer concretamente para mim, para você, para nossas comunidades e paróquias, para a Pastoral da Juventude e cada um de nossos grupos de jovens? Topamos?
Terminamos há poucos dias o 12º Encontro Nacional da PJ. Como estamos acolhendo/reconhecendo as boas noticias e os chamados que vem através dele? É preciso que a gente se esforce para ultrapassar debates superficiais, que por vezes alguns que se acham “donos” da verdade e da doutrina travam nas redes sociais… O importante é a Boa Noticia do Reino de Deus que deve ser anuncia as juventudes, em especial as juventudes empobrecidas e marginalizadas.
Mesmo de forma breve vamos dar uma olhada nas outras leituras. O texto de Jonas já é um pouco conhecido. Ele tinha que ir a uma cidade para anunciar a eles a necessidade de mudança. Para aonde precisamos ir a anunciar? As grandes provocações das leituras de hoje implicam em sentir a urgência de conversão da mudança, como também prestar atenção. O profeta recebe uma missão. Os habitantes da cidade escutam o profeta e se arrependem. Tomam atitudes que dentro dos costumes judeus da época queriam expressar a penitência, o desejo da mudança de vida. Aqui temos uma chave importante para contemplar o mistério da fé cristã. Deus não castiga. Deseja o bem, a felicidade de todas as pessoas humanas.
Já na segunda leitura o apostolo Paulo, ao tentar instruir a comunidade de Corinto sobre as relações humanas, aborda o tema da liberdade que deve marcar a vida dos cristãos. Nada deveria “segurar” um discípulo de Jesus. Ele vive livre. Ao abordar a dimensão transitória das coisas, Paulo nos ilumina para viver num mundo em mudanças.
Olhando o conjunto das leituras deste domingo, estamos diante de encontros que fazem surgir novas relações. A urgência do Reino nos desafia a fazer escolhas. A escolher o Evangelho, mudar de vida. Ouvir, nos acontecimentos históricos, o chamado do Mestre e ir com ele pelos caminhos da vida.
Por Joilson Toledo, FMS