A pedra fundamental que faz a Igreja
Por Roneide e Wellington Moreira
Uma vez vimos nosso querido amigo da juventude, Jorge Boran, usar a imagem de um grupo de jovens para expor como começou a incrível história da nossa Igreja. A imagem simbólica dos doze apóstolos.
Segundo a narração dos evangelhos, podemos dizer que eram jovens, uma vez que somente Pedro é mencionado como casado, permitindo-nos deduzir os demais como moços solteiros.
Então, é possível afirmar que a primeira comunidade formada por Jesus era um “grupo de jovens”, a partir do qual se formou o que vivenciamos como Igreja Católica Apostólica Romana, sem mencionar os nossos irmãos protestantes, que também bebem dessa mesma fonte de origem.
Foi no seio desse grupo que Jesus estabeleceu a pedra angular de sua proposta do Reino de Deus. Foram suas primeiras testemunhas. As que possibilitaram chegar até nossos dias o nome do Galileu e seu projeto de justiça e paz.
O testemunho é a principal mensagem das leituras deste domingo em que se comemora a Solenidade dos Apóstolos São Pedro e São Paulo.
No Evangelho (Mt 16,13-19), Jesus provoca seus discípulos sobre quem Ele é. Aqui não se trata de fama, prestígio, status ou coisas do tipo. Sabemos muito bem que o Nazareno não se preocupava com seu perfil nas “redes sociais” daquela remota época. Até porque as massas costumam captar as aparências e superficialidades das lideranças e de seus ídolos. Porém, é na intimidade e proximidade de um grupo menor e perene que realmente podemos conhecer e ser conhecidos.
Para Jesus não importa tanto o que “dizem os homens”. Importa o que dizem os seus homens, amigos e companheiros de caminhada, as suas testemunhas. E é a liderança do grupo, Pedro, que de forma corajosa declara em alto e bom som que Jesus, uma pessoa simples da periferia, é “o Messias, o Filho do Deus vivo”.
Pronto. Falou.
Se para nós, cristãos, é tão comum e óbvio dizer isso tantas vezes hoje em dia, não era nenhum pouco naquele âmbito social e religioso. Foi, no mínimo, uma declaração impactante, senão escandalosa e blasfema.
Pode ser que não tenhamos noção do quão impressionante foi essa fala naquele contexto. Jesus tem essa compreensão, por isso felicita Pedro.
Mas Jesus não exalta a pessoa de Pedro, o grande e especial portador das chaves dos céus, considerado o primeiro papa. É sua declaração que é enaltecida, ou seja, seu testemunho.
Na verdade, é a “fé testemunhada” a pedra fundamental sobre a qual se construiu a Igreja. É o testemunho de fé dos apóstolos e de todas as discípulas e discípulos, no passado e no presente, que edificam e sustentam ainda hoje as comunidades cristãs e as fazem vivas.
E o testemunho aqui não é uma bíblia embaixo do braço. Não são templos lotados. Não são espetáculos religiosos com padres ou pastores midiáticos. É algo bem mais exigente, arriscado, incômodo. Inclusive tão espantoso quanto a declaração de Pedro.
Por isso a segunda leitura deste domingo traz o martírio do apóstolo Paulo, que guardou e testemunhou a fé até sua decapitação (2Tm 4,6-8.17-18). Paulo, assim como Tiago na primeira leitura (At 12,1-11), testemunhou Jesus abrindo mão da própria vida.
O testemunho usado por Jesus como base da construção de sua Igreja é a vida de fé dos cristãos. A vida que se doa até o limite. A vida que luta, protesta, reivindica e indigna-se sem esquecer de celebrar.
A vida que tem fé em Jesus de Nazaré da Galileia acredita e busca concretizar o Reino, o outro mundo possível, a utopia, mesmo diante de tragédias e absurdos, como os que a CPI da Pandemia do Senado Federal têm revelado atualmente.
Interessante notar na primeira leitura que, o povo, embora impotente diante de um governo totalitário e perseguidor, não perde a fé e reza continuamente ao Pai enquanto Pedro era mantido preso por Herodes. O autor do salmo deste domingo também fala como testemunha de fé (Sl 33).
Fé testemunhada é fé provada no dia a dia, que mantém a esperança e alimenta a vontade de mudanças diante da fome, do desemprego, do corte de verbas para políticas públicas, do extermínio de jovens, de toda forma de preconceito e discriminação.
Isso, sim, é testemunhar o Cristo. Isso é ser e fazer Igreja a partir de seu fundamento, da sua base, da pedra angular.
Roneide e Wellington Moreira são assessores da Pastoral da Juventude da Diocese de Rio Branco, Acre.