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EM MARCHA CONTRA O EXTERMÍNIO DOS JOVENS

 Estamos em marcha contra o extermínio dos jovens em nossa sociedade. As pastorais da juventude iniciaram essa marcha depois do assassinato do Pe. Gisley[1], assessor nacional do Setor Juventude. Um dia antes de sua morte o Pe. Gisley cunhou uma frase que foi encenada por todos os cantos de nosso país pelos jovens ligados às pastorais da juventude: “Vamos juntos gritar, girar o mundo, chega de violência e extermínio de jovens”. Essa campanha continua atual e desafia as autoridades civis e religiosas e nos faz pensar sobre os caminhos do amanhã. O que podemos fazer para “cessar fogo” em nossas praças? O que fazer para que as drogas “percam terreno”? O que fazer para motivar os jovens para o estudo, a reflexão, a música e o sentido da vida? A música ocupou amplos espaços e a violência ganhou sinais de vitalidade e grande notoriedade depois que os jovens começaram a ficar orgulhosos por estarem sendo filmados exibindo-se com atos violentos. Os inúmeros preconceitos, a falta de compreensão diante das diferenças e a imposição da opinião contrária através da força tem se espalhado em toda parte. Vivemos momentos de grande euforia, crescimento econômico e desenvoltura tecnológica, mas também estamos mergulhados em desastres ambientais, fragilidades econômicas (crises mundiais), fome, miséria, dor, abandono e morte. Não podemos ficar indiferentes com esse mundo transformado num verdadeiro caos (Haiti, Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre…). Os problemas pessoais não podem nos anular diante dos problemas dos outros. As soluções são coletivas, passam pela mediação política e exigem uma “força tarefa” de toda a comunidade e não apenas das autoridades.

                Quando mencionamos a questão do extermínio dos jovens trazemos à tona elementos ligados ao trabalho. Não se trata apenas do trabalho como elemento que nos é ofertado, mas da dignidade das condições que são oferecidas ao trabalhador. Fala-se do “trabalho escravo” que também é uma forma de extermínio. Tiramos dos jovens o direito de sonhar, não damos tempo para o estudo, formamos para os trabalhos humildes e simples e não para os cargos de maior remuneração. Fala-se que o trabalhador poderia fazer muito mais em sua vida e trabalhar muito menos. Não estamos dizendo que o jovem deva ganhar sem trabalhar, o que defendemos é a qualificação profissional desses jovens. No tempo em que não está trabalhando ele precisa preparar-se para o mercado de trabalho no futuro. A própria empresa deveria pensar alguma coisa nesse sentido para que o jovem pudesse ampliar sua auto-estima e, dessa forma, inserir-se num ambiente de maior exigência a partir de sua qualificação profissional.

                Alguns jovens falam do total desprezo que as empresas tem para com os estagiários. Eles não são reconhecidos, trabalham gratuitamente e até fazem hora-extra e nada recebem. Essa falta de remuneração ao estagiário é vista como “trabalho escravo”. Não estamos no fim da linha, mas batemos de frente com uma situação de extermínio, ainda que não seja de morte. Quando trabalhamos e não recebemos, “exterminamos” as possibilidades de compra, vivemos com as bibliotecas vazias, as mesas incompletas e as contas penduradas. Vivemos da dependência de outros e nem mesmo a locomoção nos é garantida. Não se pode sonhar com grandes investimentos e o talento fica atrofiado por conta das ausências de oportunidades que a vida não foi capaz de oferecer. Não se tem escolha sobre o lugar onde se quer morar. O fato é que esse jovem precisa sujeitar-se aos lugares mais humildes, mais distantes e menos dignos. A infra-estrutura está incompleta. O esgoto é “a céu aberto”, a luz “enjambrada”, a comida é a mais barata e os passeios são “na sola do sapato”. Esses jovens não têm livros em casa e quando precisam ler devem ir até a biblioteca pública. Só para se deslocar de suas casas até chegar a uma biblioteca pública ele vai precisar gastar quatro passagens de ônibus. Tornemos o fato mais realista. Cada passagem custa, em média, 3 reais. Para ir buscar o livro ele gasta 12 reais. Depois tem a devolução, mais 12. Como ele não consegue ler em 15 dias, então ele precisa voltar à biblioteca para renovar o empréstimo. Em resumo, para ler o livro em um mês ele vai precisar desembolsar 36 reais só em passagem de ônibus. Se o jovem quiser tomar um lanche, mais algum investimento. O jovem que precisa de livros emprestados para ler normalmente trabalha durante o dia e estuda à noite. Em resumo, não tem tempo para ler. À noite, cansado, ele quer dormir. Nos finais de semana, para sair da rotina, inventa novas atividades, como o futebol, o baile, a festa, o namoro ou o passeio em algum bar perto de casa. O jovem não pode ir muito longe e nem consegue sonhar muito alto. Esse estilo de vida leva o jovem a sentir-se diminuído, fraco e pouco motivado para seguir em frente. Em certo sentido o extermínio da juventude não ocorre apenas quando o jovem está estirado no chão sem o hálito da vida, mas ocorre, de modo muito particular, quando lhe impedem de amar, de estudar, de trabalhar dignamente, de ter família, de viver um mundo mais humano e mais fraterno e de ser gente. É comum vermos os jovens sem família, entregue ao mundo do tráfico e da prostituição e fora do mercado de trabalho por falta de qualificação. A vida continua, a dor não cessa, a fome chega, o roubo aumenta, os assaltos se multiplicam e a violência ganha notoriedade. Vivemos num “mundo cão” e somos surpreendidos pelas incoerências de nossas propostas. O jovem está salvo somente quando ganha espaço na sociedade para ser um ótimo arquiteto, um grande engenheiro ou um reconhecido empresário. Contudo, a prática tem nos mostrado elementos bem diferentes. Os magnatas também estão morrendo, os empresários entrando em falência e os estudiosos se desesperando por questões pessoais mal resolvidas. Há uma notável fragilidade de toda sorte em nossa sociedade que nós não estamos conseguindo sanar com responsabilidade e grandeza de alma. Os jovens pobres estão na pior, mas ainda sentem-se salvos quando o conforto afetivo os cerca. Aprendem a sobreviver com o mínimo necessário e são felizes com isso – mas ainda falta muito para atingir o ideal. De outro lado, os jovens mais abastados não estão plenamente satisfeitos. Vivem na solidão e sem clareza das escolhas que lhes foram propostas, ou mesmo imposta.  

                Nesse jogo de fragilidades é importante dar-se conta das qualidades que o jovem humilde e simples possui e que não podem ser descartadas, e das limitações que os jovens mais afortunados possuem e que não podem ser desejadas ou agregadas em nossa lista de sonhos. O discernimento é extremamente importante. Quando o olhar subjetivo fica comprometido, salta a questão do coletivo. A marcha contra o extermínio de jovens só é possível ser feita em grupo. A palavra “extermínio” soa de maneira agressiva e apresenta-se de forma repulsiva em nossa vida. Se há um extermínio, logo há um exterminador. Quem está matando a juventude? Quem está roubando dos jovens o direito de viverem? Colocamos toda culpa no cano da espingarda, na R15 ou na bazuca. O fato é que o jovem está sendo exterminado sem receber nenhum tiro. Já falamos das condições mínimas para sobreviver, das famílias desestruturadas, da escravidão no trabalho e da falta de preparo para os empregos que se apresentam. Não queremos defender bandido e marginal, mas sejamos realistas, ninguém nasce bandido, marginal, assassino ou ladrão. A sociedade é que vai corrompendo os jovens. Quanto maior a ganância, mais visível o contraste. Quem tem algum bem cuide, porque vai perder; e quem não tem não sobreviverá sem as mínimas condições, por isso buscará onde existe. A vida tem precedência. Se o salário não veio e o emprego foi perdido, alguma coisa será feita. A vida está em primeiro lugar. Antes que deixar a fruta apodrecer, algumas atitudes são tomadas pelos jovens menos entusiasmados em achar as soluções para os problemas de maneira mais digna e honrada. Cuidar dos jovens é cuidar de nossa própria vida, de nossa família, de nossos bens e do futuro da humanidade desde o nosso presente na sua infindável complexidade.  

                A marcha não é uma simples caminhada feita no centro da cidade para impressionar quem passa pelas avenidas. A marcha é uma tomada de consciência de toda a sociedade organizada para a inclusão de nossa juventude onde quer que ela esteja. Não se trata de certo ou errado, mas de coragem para ser fazer alguma coisa. O importante é estar com os jovens, rezar com eles, trabalhar por uma causa comum e pensar a partir de suas dores. As soluções para os problemas são políticas, éticas, organizacionais, religiosas e sociais. A marcha contra o extermínio dos jovens não é uma campanha exclusiva para os jovens cristãos exterminados, mas para todos os jovens. Temos pressa para resolver os problemas, queremos documentar nossas ações e não podemos nos omitir diante das dificuldades. A nossa marcha tem elementos intelectuais, comprometimento pastoral engajado, consciência política, debates ideológicos, escuta transformadora, assembléias de lideranças, reivindicações, projetos, formação humano-cristã e profecia. A nossa marcha extrapola o lúdico, supera a expressão poética, amplia o verso musical, desdobra-se em falas acadêmicas e sintetiza-se em artigos anúncio-denúncia. Em nossas marchas defendemos a vida em primeiro lugar, a organização da sociedade, o diálogo ecumênico e o testemunho das lideranças. Os mais fortes devem emprestar seu braços e seus ombros para carregar os menos prendados. Somente a partir do princípio misericórdia, como diz Jon Sobrino, e com o princípio da solidariedade, vestido de esperança que se move pela força da fé é que seremos vitoriosos em nosso propósito de inclusão que vai muito além do precoce sepultamento.




[1] A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) divulgou, nesta terça-feira, 16, um nota sobre o assassinato do assessor nacional do Setor Juventude, padre Gisley Azevedo Gomes. Ele foi morto nesta segunda-feira, 15, e o crime está sendo investigado pela Polícia, com o acompanhamento dos advogados da CNBB e da Congregação dos Sagrados Estigmas.

Confira a íntegra da nota:

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), profundamente consternada, comunica o assassinato do padre Gisley Azevedo Gomes, CSS, assessor nacional do Setor Juventude desta Conferência, ocorrido nesta segunda-feira, 15 de junho.  O crime está sendo investigado com empenho pela Polícia com o acompanhamento dos advogados da CNBB e da Congregação dos Sagrados Estigmas (Estigmatinos), a qual padre Gisley pertencia.

Ordenado em 29 de maio de 2005, padre Gisley estava na assessoria do Setor Juventude da CNBB há pouco mais de dois anos. Comprometido com a vida da juventude, organizava, juntamente com as Pastorais da Juventude do Brasil, a Campanha Nacional contra o Extermínio da Juventude que tem como lema “Juventude em marcha contra a violência”. Lamentavelmente ele foi vítima da violência que ansiava combater.

Cf. http://noticias.cancaonova.com/noticia.php?id=273200

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"O amor não tem fronteira, a paz não tem cor, mas a fome tem rosto. Seja solidário, partilhe seu pão". 
   Pe. Marcionei 

Teias da Comunicação

Equipe Nacional de Comunicação da PJ "Teias da Comunicação"

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