2° Domingo da Páscoa: Jesus nos convida a tocar os chagados da vida

Por Robson Oliveira

Estamos a uma semana celebrando a Páscoa de Jesus, a vitória da vida contra a morte, a vitória da libertação contra todo tipo de escravidão. Com a Páscoa, Jesus entra definitivamente na vida de Deus, uma vida libertada, onde a morte já não tem nenhum poder sobre Ele.

Para a cultura Hebraica não se pode imaginar a ressureição sem o corpo. O corpo é toda pessoa tal como ela se sente enraizada no mundo, convivendo com os outros. Para os Hebreus, quando falam em corpo estão falando da pessoa com todo o seu mundo de relações e vivências, com toda a sua história, com tudo que acreditava. Quando Deus ressuscita Jesus, ao ponto de ser tocado e sentido, ele ressuscita também sua vida marcada por sua entrega ao Reino de Deus, pelos seus gestos de bondade para com os pequenos, Deus ressuscita um projeto, pela qual Jesus morreu, e foi até o fim, e o fim é a vida!

Neste 2º Domingo da Páscoa, celebrando e vivendo a presença do Ressuscitado no nosso meio, nos chama a atenção para a corporeidade da ressureição, onde nas palavras do cardeal Tolentino Mendonça, a fé é uma relação tátil. Tocar, na experiencia da liturgia deste domingo, nos coloca no caminho para reconhecer que o Ressuscitado é o Crucificado, e por isso é preciso tocar as feridas. Portanto, contemplar o Ressuscitado chagado impulsiona a continuar encontrando o mesmo Jesus nas chagas de todos os sofredores da história.

A primeira leitura (Atos dos Apóstolos, 4, 32-35) nos mostra que a verdadeira experência do Ressuscitado transforma as nossas relações humanas. Nela temos a forma de como os discípulos e discipulas de Jesus assumiram a missão do Reino. A leitura traz o retrato de uma comunidade, diversa, que assume o mesmo projeto: o Reino de Deus para todos e todas.

Aqui a comunidade que adere o projeto de Jesus, por meio dos discípulos e discípulas, testemunhas visíveis do Ressuscitado. Seus atos e sua missão mostravam que a ressureição é mais do que palavras, mais do que um alívio de consciência, mas é a prática testemunhal do Ressuscitado, capaz de romper todos os grilhões que nos escravizam, pois “Entre eles ninguém passava necessidade, aqueles que possuíam terras ou casas as vendiam, traziam o dinheiro e o colocavam aos pés dos apóstolos; depois, ele era distribuído a cada um conforme a sua necessidade” (At 4,34-35).

Aqui o testemunho de Jesus Ressuscitado, é o testemunho do seu projeto, projeto de vida para todos e todas. A Páscoa muda as nossas relações, nos compromete com os irmãos e irmãs. Acreditar no seu projeto é acreditar em um outro mundo possível. Assim vai nos motivar a segunda leitura (1 Jo 5,1-6), onde amar a Deus é amar a Jesus, e amar a Jesus é também aderir ao seu projeto. Isso Implica em amar os irmãos e irmãs, pois é preciso que a nossa existência – a exemplo de Jesus – seja cumprida no amor a todos os que caminham pela vida ao nosso lado, especialmente aos mais pobres, aos/as mais humildes, aos marginalizados/as , aos/as abandonados/as, aos sem voz. Implica não se conformar com a lógica do egoísmo, do ódio, da injustiça, da violência. O Mandamento de Deus, expresso por Jesus, é o amor comprometido e responsável com a vida, é o que dá sentindo e nos direciona para o mundo novo.

O evangelho deste domingo – João 20, 19-31 – é uma grande catequese. O relato deste domingo se passa em duas partes, uma que vincula a ressureição com a paz, com o dom do Espírito, com o perdão, com a fé e com a missão (Jo 20, 19-23), e outra que parece querer responder aos cristãos e cristãs que já não haviam conhecido o Jesus Histórico, nem participado daquela primeira experiência fundante, representada pela figura de Tomé (Jo 20, 24-31).

Muitas vezes centramos nossos olhares na figura de Tomé, diante da sua incredulidade. O texto da comunidade de João se dá primeiramente com comunidade reunida em Jerusalém, logo após a morte de Jesus, no medo, na insegurança, mas para celebrar. Dentro da casa estão “com as portas bem fechadas”. É uma comunidade sem missão e sem horizonte, encerrada em si mesma, sem capacidade de acolhimento. A presença de Jesus, mostra a centralidade, dá a paz, capacita pelo Espírito, abre a comunidade e envia para a missão, a missão é de libertar!

Tomé não estava no primeiro encontro, ele vive a experiência do Ressuscitado, dias depois, sua fé ainda abalada pelo movimento da cruz não o permite crer da mesma forma. O texto joanino nos revela que a Páscoa significa tocar com mais força, de um modo mais profundo, as chagas de Jesus ressuscitado. Tomé teve que aprender a ativar os sentidos, precisou descer do pedestal dos seus dogmas, das ideias separadas, para retomar a experiência concreta do amor de Jesus, que é a vida entregue pelos outros, amor chagado. Não basta crer em Jesus, separado de sua vida de compromisso em favor da vida; para crer Nele é preciso querer tocar suas chagas, que são as chagas do mundo ferido por falta de amor.

Tocar aa chagas de Jesus é encarnar a fé, na carne, na realidade concreta. Não é somente se gloriar na ressurreição, mas também é sentir que a chaga aberta faz parte da vitória da vida contra a morte, da vitória do amor extremo, pois as marcas, as chagas de Jesus após sua ressurreição são as cicatrizes de um compromisso, as marcas de seu projeto, pelo qual ele deu a sua própria vida.

Os sinais da Ressurreição se encontram aí onde antes se encontravam os sinais de dor e morte. Só quando assumimos esta realidade, quando a transformamos, poderemos testemunhar, como os primeiros discípulos, que o “Crucificado ressuscitou!”

A Páscoa de Jesus nos convida a tocar a acompanhar, a ressuscitá-lo nos chagados da vida


Robson Oliveira é historiador, mestre em Planejamento Urbano e Regional (Univap), a serviço da Coordenação Nacional da Pastoral da Juventude pelo Regional Sul 1 e agente pastoral no Centro Magis Anchietanum.

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