O deserto como lugar de encontro
Por Ir. Penha Carpanedo
O ano litúrgico é vivido pelas comunidades cristãs como um caminho de salvação. Caminho que expressa a manifestação de Deus em nossa humanidade concreta. Cada tempo conecta com uma dimensão da vida sempre inacabada, para impulsioná-la à completude.
Começamos o Advento acendendo uma vela. Somos seres que carregam em si, luzes e trevas. E temos dificuldade de lidar com as nossas sombras. Mas Deus pode fazer brilhar a sua luz dentro de nossas noites. Precisamos, tão somente, estar com nossos corações despertos, porque a noite induz ao sono. Este foi o apelo do primeiro domingo: vigiar.
Neste domingo, o lugar do encontro é o deserto, que é símbolo de morte, de secura, de solidão. Mas o deserto é também é lugar de renascimento. Vivendo no deserto, João o faz viver de novo. O deserto se torna lugar de acolhida das multidões, de onde podem nascer novos horizontes.
Assim como o anjo do Senhor acompanhava a travessia do povo no deserto ou como o mensageiro descrito pelo profeta Isaías [Is 40,1-11] anunciava aos exilados novo caminho no deserto, João Batista aparece no deserto pregando um batismo de conversão, como boa notícia. João anuncia aos pobres que a sua servidão está perto de acabar, porque aquele que vem, não é um juiz que batiza com fogo, não vem com poder, mas vem como Salvador que batiza com a suavidade do Espírito.
João era amigo e mestre de Jesus. Faz disso, não um privilégio, mas um serviço, sem qualquer sombra de competição. João ilumina o caminho que os seus discípulos devem tomar depois dele: Jesus Cristo, o Filho de Deus. E chama o povo a preparar os caminhos para a sua chegada. Nisto consiste a conversão: não tanto um preparar externamente, mas preparar-se, que é um movimento do coração. A conversão que João propõe não se baseia no jejum e na penitência, mas numa vida simples, sóbria, libertada dos artifícios, do consumismo, centrada no essencial, na sobriedade, como João mostrou ser possível.
No dia que a humanidade consentir em viver com o necessário, sem as absurdas diferenças que separam as elites das grandes multidões, então todos e todas poderemos viver dignamente. Contudo, esta consciência não nascerá dos grandes, só pode nascer no deserto, dos pobres que conhecem o que é viver com o mínimo, com o essencial. Mas ainda estamos longe. Ainda nos deixamos iludir com quem tem grande soma de dinheiro para bancar uma eleição, e perdemos a oportunidade de contribuir com uma política favorável ao verdadeiro bem comum. Mas a luta continua! Que o Espírito nos ilumine e nos sustente, que transforme os nossos desertos em lugar habitável.
Ir. Penha Carpanedo é membra da Congregação Irmãs Discípulas do Divino Mestre e da animação litúrgica da Rede Celebra.