Campanha da Fraternidade Ecumênica: diálogos para construir pontes

por Pastora Romi Bencke

O texto de Efésios 2.14a inspira o tema da Campanha da Fraternidade Ecumênica de 2021. O texto confessa que Cristo é a paz que derruba os muros da divisão e faz uma unidade. A carta à comunidade de Efésios foi dirigida para um grupo diverso, formado por pessoas da tradição judaica e pessoas gentílicas (não judias). O que unia estes dois grupos de pessoas era o reconhecimento de que Jesus Cristo é o Filho de Deus. No entanto, esta compreensão comum não era o suficiente para que as diferenças entre os dois grupos fossem superadas. Uma destas diferenças era a relacionada à circuncisão. Os judeus da época, que reconheciam Jesus como o Filho de Deus, compreendiam que os gentios, por não serem circuncidados, não poderiam fazer parte da comunidade que se reunia em torno da fé em Jesus Cristo. Uma das leis da pureza dizia que somente pessoas circuncidadas poderiam entrar no santuário do templo. Caso os gentios entrassem no santuário seriam penalizados com a morte, pela qual seriam responsabilizados por terem desobedecido uma das leis da pureza.

Percebe-se que o obstáculo para a unidade era a rigidez da lei. A lei provocava a exclusão e não permitia a experiência de um dos principais anúncios de Jesus Cristo: o diálogo.

Poderíamos nos perguntar pelo texto do Evangelho em que Jesus anuncia o diálogo como expressão de amor e comunhão.  Se recordarmos as parábolas e outras histórias do evangelho, poderíamos dizer que não há nenhuma afirmação de Jesus que nos comprometa com a prática do diálogo. Não temos, por exemplo, uma frase de Jesus que diga: “ide e dialogai!”

No entanto, a observação atenta da prática de Jesus nos ensina que todo o seu discipulado foi orientado pela prática do diálogo. As parábolas são o grande exemplo desta prática. Sempre que desejava problematizar uma realidade de conflitos e divisão, Jesus reunia as pessoas para conversar de forma simples, porém profunda. É por isso que nos Evangelhos temos inúmeras parábolas que explicam a importância do perdão (Lc15.11-32), a importância de irmos em direção de quem, por alguma razão, não se sente incluído (Mt 18.10-14), a da centralidade da solidariedade (Lc15.8-10), entre outras. Além das parábolas, Jesus pratica o diálogo em todo o seu ministério. Lembremos o diálogo de Jesus no templo, com os doutores da Lei ( Lc 2.41-52), seu diálogo com os homens que iriam apedrejar uma mulher que supostamente havia sido pega em adultério (Jo 8.1-11), o diálogo com a samaritana (Jo 4.4-26). Estes são apenas alguns exemplos de que Jesus nunca se negou a dialogar com ninguém. Em sua prática de diálogo todos os temas controversos de sua época estavam presentes.

O tempo em que Jesus viveu também era caracterizado por polarizações e práticas autoritárias, identificáveis na centralidade da Lei acima da vida (Mt12.1-8), pela relação distorcida entre o Templo e o poder econômico e político (Mc 13), pela exclusão das mulheres (Jo 12.1-11), pela exclusão das pessoas portadoras de deficiência (Mc 10-46-52). Portanto, Jesus não viveu em uma sociedade caracterizada pela equidade e pela igualdade. O tempo em que Jesus viveu era de muita desigualdade e opressão política, econômica, religiosa e de preconceitos. É por este motivo que o ministério de Jesus se caracteriza pelo diálogo, pela solidariedade e por práticas de misericórdia.

Quando somos batizados e batizadas somos acolhidos e acolhidas como filhos e filhas de Deus. O Batismo, mais do que um ritual, representa nosso compromisso com este projeto de diálogo e comunidade de iguais praticado e anunciado por Jesus Cristo.

A Campanha da Fraternidade Ecumênica, portanto, ao expressar que o diálogo é um compromisso de amor, nos convida para o engajamento pela equidade e pela inclusão das pessoas que estão separadas pelos muros da indiferença, da desigualdade, da violência, do racismo, dos preconceitos.

Se Cristo é a nossa paz, por que ainda persistem os muros entre nós? Porque, em tempos mais recentes, o nome de Jesus tem sido utilizado para justificar e legitimar atitudes de violência e de levantamento de muros. Todos os muros representam exclusão. Em Cristo Jesus, a exclusão não é aceitável. Jesus anunciou e praticou a paz e não o ódio.

Que nos animemos e nos desafiemos, como pessoas batizadas e sermos mensageiros e mensageiras desta paz que é inquietante, provocativa e que abala os muros da divisão e constrói pontes.

Pastora Romi Bencke é pastora da Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil e secretária executiva do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs – CONIC.

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