Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha – cartas de luta e esperança

Rio de Janeiro, 25 de Julho de 2022

Querida Aldiceia,

Hoje é o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, em
homenagem a luta e a resistência de tantas companheiras. Este dia foi instituído pela
Organização das Nações Unidas (ONU) e teve origem durante o 1º Encontro de Mulheres
Afro-Latino-Americanas e Afro-Caribenhas, realizado em Santo Domingo, na República
Dominicana, em 1992. O evento reuniu mais de 300 representantes de 32 países para
compartilhar suas vivências, denunciar as opressões e debater soluções para a luta
contra o racismo e o machismo.
No Brasil, a data também é uma homenagem à Tereza de Benguela, conhecida
como “Rainha Tereza”, que viveu no século XVIII, no Vale do Guaporé (MT), e liderou o
Quilombo de Quariterê. Segundo documentos da época, o lugar abrigava mais de 100
pessoas, incluindo indígenas. Sua liderança se destacou com a criação de uma espécie
de Parlamento e de um sistema de defesa. Tereza foi morta após ser capturada por
soldados.
Contudo, apesar da memória super importante do dia de hoje, me pergunto,
querida Aldi, se temos motivos para nos alegrarmos ou ficarmos preocupados. Durante
este período pandêmico, muita coisa que já estava ruim, infelizmente se potencializou
negativamente. Quantos casos de agressões de todos os tipos atingiram nossas
companheiras, quantos retrocessos tivemos nos direitos femininos, conquistados a base
de muito suor e luta. As vezes, confesso, que é difícil manter a crença na mudança.
Porém, mesmo com todo esse caminho de incertezas e desafios, ainda rezo e
tenho esperança que dias melhores possam florir ao longo do percurso. Que Santa
Efigênia e a Negra Mariama estejam contigo, querida Aldi! Ansioso por revê-la, e pelo dia
em que nós iremos nos alegrar ao ver que a semente do pesado caminhar, irá frutificar.
Lhe desejo toda a força e amor das companheiras que deixaram seu legado (Maria
Quitéria, Dandara, Tereza de Benguela, Rosa Maria, Mariele Franco). Estamos juntos,
minha amiga!
Amém, Axé, Awerê,Aleluia! Do seu amigo/irmão

Renan Gentil


Espírito Santo, 25 de julho de 2022

Querido amigo, Renan,
Lembrar o dia 25 de julho, não é festejar ainda, mas é um dia para fortalecer a luta
e a memoria de nossas ancestrais, como Tereza de Benguela, que mostrou a força e
eficiência das mulheres pretas, com uma liderança, inteligente e estratégica e cuidadosa.
Motivos para nos alegrar, buscamos diariamente, pois é necessário para seguir
sonhando e lutando, além de ser parte da nossa herança, a alegria. Motivos para nos
preocupar, esses nos buscam sempre, infelizmente, nossos corpos femininos e pretos,
seguem sendo desrespeitados diariamente.

Tem um provérbio Africano que diz: “Quando o rio seca onde nasce, ele seca e
morre.”
Mas hoje é um dia de fazer memória, algo necessário, para lembrar de onde
viemos, e de tudo que nossas ancestrais construíram até aqui e assim seguir sem perder
a direção, como um rio caudaloso que segue na ânsia de desaguar no mar, seguimos na
ânsia, de desaguar no mar da liberdade, onde nossos corpos possam ser livres, onde
possam nos reconhecer como seres humanas.
Falam sobre a tolerância racial, tenho para mim, que essa já existe, apesar dos
retrocessos, toleram nossas presenças em certos espaços, em função das leis, que a
custas de muito suor e as vezes sangue das nas nossas, foram conquistadas, mas não
nos basta ser toleradas, com nossas presenças condicionada a coisas, muitas vezes tão
frágeis, sendo violentadas de várias formas, para sermos aceitas, como pessoas, como
mulheres. Nossa luta, nosso sonho são por vida, vida digna, por respeito.
Nesse dia 25 de julho, reverenciamos pretas de ontem e de hoje, que seguem
levando adiante o legado, como rainhas, princesas, guerreiras, que mesmo sequestradas,
de suas terras e de suas histórias, seguem abrindo caminhos para a liberdade,
empunhando, seja espadas, seja canetas, se negam ser silenciadas, apagadas, como
Tereza de Benguela, a grande homenageada, mas também , Zacimba Gaba, Constância
D’Angola, Elza Soares, Djamila Ribeiro, nos ajudando a manter firme na direção, a manter
a esperança, na grande noite da liberdade em que dançaremos livres e alegres a luz do
luar.
Gratidão por fazer esse caminho contigo, querido Renan, na expectativa do
reencontro, lhe desejo a força e a coragem de nossas ancestrais, deixo meu abraço e o
desejo que a Negra Mariama lhe guarde por onde pisar.
Amém, Axé, Awerê, Aleluia! De sua amiga/irmã

Aldiceia Costa

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