Jesus de Nazaré:  presença, proposta e palavra que ilumina o nosso caminhar

Por Ir. Joilson Toledo

Estamos no segundo domingo da quaresma, no entanto, à luz da fé, podemos dizer que para muitos de nós, esta pandemia, com as consequências desafiadoras que trouxe, tem sido um caminho quaresmal. São mais de 650 mil vidas perdidas no Brasil. Nas últimas semanas, o mundo viu-se, de uma forma ou de outra, afetado por uma guerra.

 Tocamos nossa fragilidade e finitude, fomos tocados pela ternura de Deus expressa em gestos de solidariedade. Vimos, por diversas formas, o valor da vida ser afirmado e negado. Tudo isso foi sinal da urgência e da presença do Reino. Fez/faz ecoar em nossos corações o convite da quarta-feira de cinzas: “convertei-vos e crede no Evangelho” (Mc 1, 15). É convocação para resgatar a fraternidade em situações em que ela foi ferida. É aceno ao mergulho no mistério pascal do Cristo e caminho de discipulado. É neste contexto que somos chamados a acolher as inspirações e as provocações que o segundo domingo da quaresma nos trazem.

O trecho do Evangelho que lemos em nossas comunidades (Lc 9,28b-36) é a transfiguração do Senhor a partir do Evangelho de Lucas. Como é comum neste Evangelho, vemos Jesus rezando (Lc 4, 42; 5, 16; 6, 12; 9, 18.28; 11, 1citações). Para a Comunidade Lucana, a oração é um ponto sempre destacado. Jesus se retira para rezar antes de decisões importantes. “A vida necessita de pausas” (Carlos Drummond de Andrade). Jesus nos mostra que no decorrer do caminho é preciso, às vezes, parar para reconectar, tomar consciência, reconhecer o Deus-amor que caminha conosco.

O trecho tem uma série de imagens profundamente significativas: a montanha; as vestes brancas; a luz; a nuvem; Moises e Elias. São sinais que evocavam as grandes esperanças do povo de Israel. Eles trazem presentes a experiência do Êxodo, memória potente do povo da primeira Aliança. Que faz lembrar quem eles são e quem eles são chamados a ser. Quais são as memórias potentes que iluminam, demarcam seu caminhar? Que memória “diz” quem você é e testemunham seus sonhos mais profundos?

Ao utilizar todos estes símbolos, os evangelhos querem nos dizer que Jesus é a nossa esperança. A comunidade é convidada a viver um novo Êxodo, no qual Jesus é o caminho, a palavra e a presença de Deus. Não seria esta uma das certezas de fé que neste tempo precisa estar bem viva em nosso coração? Em Jesus de Nazaré, o Deus que é luz, vida e amor está no meio de nós. Ser discípulo dEle é se pôr  a caminho com a luz da transfiguração tão presente no coração e assim conseguimos atravessar os conflitos, as cruzes, os momentos permitindo que os sinais dissipem-se. No Cristo, as esperanças mais profundas da humanidade concretizam-se. NEle encontraremos a força para “juntar mão com mão” e esperançar juntas e juntos.

A nuvem aparece no êxodo (Ex 13, 22; 24,15-16; 40, 34.36-37), na fala do anjo que diz que o espírito cobrirá Maria com sua sombra (Lc 1, 35). A nuvem é um sinal da presença de Deus. Dela vem a voz de Deus: “Este é o meu Filho, o Escolhido. Escutai o que ele diz” (Lc 9, 35). Esta frase poderia ser um resumo de toda mensagem/experiencial quaresmal. Na realidade/nuvem o Pai convida a cada um de nós a ouvir o Filho, mas o que significa ouvir o que o Cristo diz? Eu e você somos convidados neste tempo quaresmal a ouvir a Palavra de Deus presente na Bíblia e na vida.

Pedro propõe parar ali (Lc 9, 33). A proposta de Pedro é mais uma tentação de querer “parar” nas experiências luminosas. Contudo, estes momentos da vida são para nos fortalecer para caminhar. A luz da transfiguração prepara-nos para viver a cruz, que é consequência do caminho escolhido por Jesus e seus discípulos. Ser discípulo de Jesus é se pôr a caminho com a luz da transfiguração tão presente no coração, que conseguimos atravessar os conflitos, as cruzes, os momentos que os sinais parecem se dissipar.

A primeira leitura (Gn 15, 5-12.17.18) sinaliza que a experiência expressa no Evangelho é realidade e promessa. Força que impulsiona a caminhar. Aliança de Deus feita com seu povo. A segunda leitura (Fl 3, 17-4,1) enfatiza nas consequências desta aliança em nossas vidas e em nosso corpo.

Não sabemos por quanto tempo ainda viveremos esse tempo pandêmico. Muitos de nós ainda não vivenciamos plenamente os lutos pelas perdas deste período. Ainda não demos abraços ou oferecemos/buscamos ombro amigo para chorar o que é preciso. É neste momento de fragilidade que a luz do transfigurado encontra-nos. Na realidade da vida, aparece “a nuvem”, que o tempo quaresmal seja o momento favorável de ouvir a voz e recalcular rotas/posturas/escolhas para seguir Jesus.

Ir. Joilson Toledo é marista, mestre em Ciências da Religião e atua na assessoria da PJ na Arquidiocese do Rio de Janeiro.

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