NOTA DA PASTORAL DA JUVENTUDE CONTRA A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

Em meio à grave crise sanitária e social que vive o Brasil, volta a cena um debate delicado para um dos países que mais extermina jovens em todo mundo: a redução da maioridade penal. Desta vez, a PEC 32/2019, proposta no âmbito do Senado Federal, é a que ganha destaque após endosso da Secretaria Nacional de Juventude (SNJ). O texto, mais radical que outras propostas anteriores, prevê redução da maioridade penal para 16 anos e, em caso de crimes considerados mais graves, para 14 anos. A Pastoral da Juventude, coerente à seu histórico de quase cinco décadas de luta em favor da vida das Juventudes, vem a público reiterar sua posição contrária, repudiar qualquer defesa dessa pauta e reforçar os argumentos que nos levam a dizer, com fidelidade evangélica: dizemos NÃO à redução da maioridade penal.

O cuidado da PJ para com a vida e a defesa das juventudes sempre foi bandeira de luta em nossa história como atestam a realização de várias campanhas pautadas nos direitos humanos: Campanha Nacional Contra a Violência e Extermínio de Jovens (2009-2015); o projeto A Juventude Quer Viver (2002-2014); Campanha Nacional Diga NÃO à redução da maioridade penal (2009-2015);  Campanha Nacional de Enfrentamento aos Ciclos de Violência Contra a Mulher (2017-2023). É com esse acúmulo de estudo, debate e construção que apresentamos nossos argumentos diante dessa pauta.

Dados de 2017 [1] mostram que o Brasil é o terceiro país com maior número de pessoas presas. A taxa de presos sobe cada vez mais, sendo que cerca de 40% dos encarcerados são provisórios, ou seja, ainda não têm condenação judicial. Mais da metade dessa população é de jovens de 18 a 29 anos e 64% são negros. Os dados são do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (2017).

Pela incompetência e omissão do Estado e da sociedade vê-se uma grande negação dos direitos fundamentais que estão constitucionalmente garantidos. E, nesse cenário, prefere-se jogar os/as jovens e adolescentes para trás das grades a garantir os direitos fundamentais deles/as. Negligencia-se, assim, o compromisso com aqueles e aquelas que mais sofrem, sendo estes, em sua maioria, pretos, pobres e periféricos.

O Estado brasileiro não tem efetivado a aplicação das medidas socioeducativas e de proteção que estão previstas no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) Lei nº 8.069, no Estatuto da Juventude Lei nº 12.852, nas regras Mínimas de Beijing, na cláusula pétrea constitucional – Constituição Federal (CF), art. 228 –, na Convenção dos Direitos da Criança e do Adolescente, nas Diretrizes para Prevenção da Delinquência Juvenil e nas Regras Mínimas para Proteção dos Menores Privados de Liberdade (Regras de Riad) e no Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo-SINASE Lei n° 12.594. Poucas são as iniciativas de execução de políticas públicas de juventude eficientes e que são essenciais para uma vida digna e segura. Cremos que a prevenção é o melhor caminho e não a punição!

Trancar jovens com 14 ou 16 anos em um sistema penitenciário falido que não tem cumprido com a sua função social, não assegura a reinserção e reeducação dessas pessoas, muito menos a diminuição da violência e fere o artigo 227 da CF. Ainda mais se tratando de adolescentes/jovens em que não se pode abrir mão das medidas socioeducativas como um todo, visando a sua reinserção na família e na sociedade, além da prevenção a prática do ato infracional para assim tentar garantir uma transformação de vida, não retornando no sistema. A proposta de redução da maioridade penal fortalece a política criminal e afronta a proteção integral do/a adolescente.

Compreendemos que a criminalidade e a violência na qual estão inseridos/as adolescentes e jovens são frutos de um modelo neoliberal de produção e capitalismo que opera na manutenção das injustiças e desigualdades socioeconômicas, e devem urgentemente ser transformadas, especialmente a partir da efetivação de políticas que garantam direitos básicos à juventude e adolescentes, como o direito à educação e saúde de qualidade, moradia digna e trabalho decente.

Não podemos compactuar com tal medida, pois vai na contramão do nosso desejo e horizonte de vida em plenitude (Jo 10,10) para todas as juventudes. Conclamamos a sociedade a compreender que é tarefa de todos/as trabalharmos pela cultura de paz e do bem-viver, priorizando o cuidado, a escuta e o compromisso com a vida da juventude, adolescentes e crianças para um Brasil pleno de paz, justiça e dignidade.

A Pastoral da Juventude do Brasil, portanto, em sintonia com a Igreja, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB),[2] os ensinamentos de Jesus, que propõe uma sociedade baseada no caminho da misericórdia e jamais da vingança social, reitera que está atenta às movimentações que atacam os direitos juvenis e diz NÃO, mais uma vez, ao absurdo de querer reduzir a maioridade penal em um país que tem dívida histórica profunda com as Juventudes, especialmente a negra e periférica que, se não bastasse o extermínio diário, agora encontra-se como alvo preferencial de uma política de morte. Anunciamos, profeticamente, que acreditamos na vida, na reparação, nos direitos e na construção da paz como fruto da justiça (Is 32,17).


CONTRA A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL – LINKS IMPORTANTES

Brasil tem a 3ª maior população carcerária do mundo, com 726.712 mil presos

Levantamento Nacional DE INFORMAÇÕES PENITENCIÁRIAS

REGRAS MÍNIMAS DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA , DA NFÂNCIA E DA JUVENTUDE (REGRAS DE BEIJING)

Convenção sobre os Direitos da Criança -Instrumento de direitos humanos mais aceito na história universal. Foi ratificado por 196 países.

DIRETRIZES DAS NAÇÕES UNIDAS PARA PREVENÇÃO DA DELINQÜÊNCIA JUVENIL DIRETRIZES DE RIAD

Diretrizes de Riad Diretrizes das Nações Unidas para Prevenção da Delinquência Juvenil


[1]    Disponível em: https://www.conectas.org/noticias/brasil-e-o-terceiro-pais-que-mais-encarcera-pessoas-no-mundo?gclid=Cj0KCQiAw_H-BRD-ARIsALQE_2P7XNh0gntsf_VtDemVNCJ_fMpzOxYoBCv8ojB9WVxOP_2CaBMzCDMaAk-cEALw_wcB. <Acesso em 18 de dezembro de 2020>.

[2]    https://www.cnbb.org.br/posicao-da-cnbb-sobre-a-reducao-da-maoridade-penal/

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