O advento e a necessidade de uma nova geração de cristãos

Por Wellington e Roneide Moreira

Estamos finalizando mais um tempo de advento. Durante as últimas três semanas fomos convidados a gestar, mais uma vez, o menino Jesus. Não no ventre, como Maria fez há aproximadamente mais de dois mil anos, mas em nossos corações.

Nessa gestação do Deus-Menino em nossas almas, nessa preparação para sua chegada, façamos diferente dos parentes de José em Belém. Eles não acolheram bem sua esposa grávida e seu bebê que estava a caminho.

A Sagrada Família teve que se instalar na parte menos privilegiada de uma casa, junto com os bichos domésticos. Ali, Maria sofreu as dores do parto que trouxe o verbo encarnado ao mundo, mas que não foi adequadamente acolhido desde seus primeiros dias.

Parto. No advento esperamos por esse parto especial, que é o Natal. Contexto interessante para ecoar as palavras ditas por Jesus em Jo 3,3, e, assim, celebrarmos seu nascimento fazendo um exercício espiritual para nascermos de novo.

Neste domingo, iniciamos a quarta e última semana do advento com a passagem da anunciação do anjo Gabriel à Maria (Lc 1,26-38). Como ocorre em todo o livro sagrado, podemos extrair desta parte diversos ensinamentos.

Vamos concentrar-nos no início do texto. Onde o portador da mensagem divina teve que ir para entregá-la a sua destinatária?

À Nazaré, na Galileia, ou seja, o anjo foi à periferia. E mais, ao interior do interior, um pequeno e desconhecido povoado, como citou o teólogo Antônio José Pagola em sua obra “Jesus: aproximação histórica” (2012, pp. 62-65). Na época, um lugar tão insignificante, econômico e geopoliticamente, que ensejou a expressão preconceituosa de Natanael: “De Nazaré pode sair coisa boa?” (Jo 1,46).

Quanto à destinatária da mensagem, podemos dizer que, historicamente, o estereótipo da mãe de Jesus nada tem haver com o de uma nobre europeia. Está mais para uma lavradora de pouca ou nenhuma instrução formal. Assim, devemos imaginar Maria como uma mulher comum de seu tempo, portanto, de baixa estatura, do lar, com pele castigada pelo sol, moradora do interior do seu país, e muito provavelmente não alfabetizada, mas profundamente religiosa, pois cheia da graça divina (Lc 1,28).

Essa é a origem histórica do primogênito de Deus: humilde e pobre. Assim veio ao mundo, e assim passou toda a sua experiência terrena. Nada de pompas e circunstâncias.

Foi assim que o Pai revelou-se ao mundo por meio de seu Filho. Na simplicidade, na carência. Paulo, na segunda leitura deste domingo (Rm 16, 25-27), fala desse mistério revelado, ao qual devemos dar “glória, pelos séculos dos séculos”. Isto é justo e necessário.

Todavia, neste ponto é importante abrir um parêntese. Ao referirmo-nos ao Altíssimo temos a ação natural de exaltá-Lo. Porém, corremos o risco de esquecer e ignorar o essencial em sua mensagem, em seu mistério. Voltar às origens de Jesus, à Nazaré, previne que não nos percamos em meio aos ritos, paramentos, títulos eclesiásticos e discursos doutrinários.

Ele foi fiel às suas origens mesmo depois da cruz. Maria concebeu-O em sua humilde casa, dando sim à encarnação do Deus-Filho em seu ventre sem testemunhas, discretamente (Lc 1,38). Jesus seguiu sua vida evitando a fama. Morreu como um blasfemo zé-ninguém perante a sociedade que o rejeitou, e como um arruaceiro, um criminoso qualquer perente o Estado que o executou. E ressuscitou na intimidade do seu círculo de parentes e amigos, simples e pobres como Ele, a sua comunidade. Sempre soube de onde havia vindo e qual o seu lugar neste mundo entre os últimos, desde sua concepção.

A primeira leitura deste domingo, extraída do Segundo Livro de Samuel (2Sm 7,1-5.8b-12.14a.16) e o Salmo (Sl 88,2-3.4-5.27.29) tratam do messianismo, baseado na promessa de Deus em estabelecer um reinado próspero, estável e feliz a partir da casa e descendência de David, o famoso rei de Israel. Na tradição judaico-cristã, Jesus é o cumprimento dessa promessa (Lc 1,32-33). É o messias. E o natal é o evento por meio do qual o prometido começa a ser concretizado na história da humanidade, revelando ao mundo o que era “mantido em sigilo desde sempre”, como disse Paulo na sua Carta aos Romanos (Rm 16,25).

As leituras deste quarto domingo do advento (ano B) fazem uma ponte entre David (2Sm 7,12; Sl 88,5) e Jesus (Lc 1,32). Dito isto, precisamos fazer outro parêntese. Assim como o Nazareno, aquele rei de Israel também teve uma origem simples. Era um pequeno pastor de ovelhas, da singela cidade de Belém, e era o menor entre seus irmãos de sangue (1Sm 16,1-12). Contudo, sabemos que David levou parte de sua vida em torno do poder e da grandeza. Esqueceu ou distanciou-se daqueles aspectos da sua origem?

Jesus agiu diferente. Sendo sempre o menor entre os homens, revelou-se imensamente maior que David. Fez-se e manteve-se pobre. E o seu nascimento é um chamado à pobreza, oportunidade em que somos desafiados a rever nossas relações e estilo de vida moderno.

Vivemos abusando da casa comum, e explorando e excluindo uns aos outros. Há muito se denuncia os problemas ambientais e as injustiças sociais e econômicas presentes no mundo. Estes são problemas postos que colocam em questão as sociedades atuais e arriscam a sobrevivência da humanidade, especialmente das gerações mais jovens e futuras.

Eis o desafio lançado pelo nosso atual papa, sobretudo às juventudes. As discussões por ele levantadas, sobre ecologia integral e sobre a economia de Francisco e Clara, são bons pontos de partida para o advento de uma nova geração de jovens comprometidos com todos os aspectos da criação.

Essas questões problemáticas são urgentes, mas não sabemos quais e quando veremos os efeitos das provocações que o papa Francisco tem feito ao mundo inteiro. Ele vem tentando fazer com que a Igreja retome a proposta de volta às suas origens (simples), iniciada com o Concílio Vaticano II na década de 60 do século passado.

Porém, para isso ocorrer de fato, necessitamos formar novas humanidades para enfrentar com consciência, criatividade e coragem as causas daqueles problemas. E espaços como a Pastoral da Juventude precisam ter isso muito claro em seus propósitos para continuarem sendo um bom celeiro de novas e novos jovens, capazes de renascerem a cada Natal.

Acolher o Menino-Deus na festa natalina é compreender e praticar sua Palavra. Ele não foi bem acolhido há dois mil anos atrás. Será que hoje estamos preparados para essa acolhida, que tem tornado-se, ecológica e socialmente, mais urgente a cada ano? Diante de tantos problemas sociais gritantes, que mudança de vida e de visão de mundo o nascimento de Jesus deve provocar em nosso meio?

Para responder é necessário buscar discernimento, e agir para que este período do advento engravide nossos corações, e que o Natal que se aproxima sirva de parto para o surgimento de novas cristãs e novos cristãos, todas e todos impregnados dos valores do Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo, que, lembremos, nunca deixou de ser da periferia, ou melhor, do interior do interior, da Nazaré dos pobres José e Maria.

Wellington e Roneide Moreira são assessores da Pastoral da Juventude da Diocese de Rio Branco

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